terça-feira, 14 de dezembro de 2010

JOSÉ

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?


Carlos Drummond

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

O pequeno paradoxo das relações humanas

O trabalhador passou a puxar a sua própria carroça, ao invés de usar o burro, ao mesmo tempo em que o trabalho em massa é substituído por maquinas cada vez mais complexas, o trabalhador se sujeita a funções cada vez mais “pesadas”.

Enquanto o homem puxa a sua carroça no centro movimentado, o empresário sentado em seu banco de couro, com o ar ligado e tão alienado quanto sujeito que se encontra a sua frente, buzina incansavelmente imaginando como estão indo seus negócios sem sequer notar a presença do humilde trabalhador que se esforça para carregar a imensa quantidade de papelão, muito maior é seu esforço agora para dar licença ao senhor.

Insatisfeitos com o grande avanço tecnológico que o ferro proporcionou no transporte rodoviário, tiveram que dividir este grandioso avanço em classes econômicas, assim foi com os navios, aviões... o paradoxo da sociedade esta tão presente no dia-a-dia que acabamos por não ver nitidamente em todos os momentos, assim como o empresário que esta com pressa, o pobre sujeito com fome, ou qualquer outro cidadão que é por natureza alienado e sempre tentando saciar suas necessidades insaciáveis e desnecessárias. A cidade é o habitat do capitalismo e nela ele consome toda a sua energia, prega toda as suas pecas e lança todas as suas teias até o campo, com a televisão, por exemplo, chegando ao humilde agricultor (os poucos que restam, pois os outros são na maioria latifundiários, de média ou grande propriedade, me refiro ao trabalhador do campo em si), que passa a ver a sua realidade de maneira negativa e se sente infeliz com sua condição, principalmente por sua ignorância, pois não teve instrução para interpretar aquilo que vê na tv, alienado com a cidade, suas lindas praias (Rio por exemplo), pessoas bonitas (um dos novos conceitos de beleza que ele passa a ter) e felizes, pensa em se mudar para a cidade. Passa porem a ser mais um pobre trabalhador explorado do capitalismo selvagem e sem opções de vida e sem saber o que fazer, aceitando simplesmente a situação, infeliz porem, mais que no campo e sem opção de voltar na maioria das vezes. Isto quando ele vai para a cidade obrigatoriamente, pois onde ele trabalhava passa a ser um latifúndio, ou a modernização do campo, uma das teias do capitalismo (junto com o latifundiário) tirou a sua função.

Este é em minha opinião um assunto que foi pouco questionado nos textos referidos neste trabalho e que foi uma das principais conseqüências do cercamento do campo, no inicio do séc XIX, e do êxodo rural na Europa com a industrialização.

Os pobres constroem e conservam sobre mando dos ricos para que estes usufruam.

E o paradoxo continua não somente em cenas como no transito, mas em todos os momentos do dia, em qualquer ação que venhamos a fazer, pois tudo envolve dinheiro e nem todos podem fazer o mesmo, desde as mais simples necessidades (como higiene, boa alimentação...) até as coisas complementares (dignidade, afeto...).

O capitalismo pode não compra tudo, mas compra as pessoas, suas mentes, e algumas podem vender até de graça. Compra o sexo, porem não o amor, pois até o mais humilde trabalhador tem o amor de sua humilde esposa, e amizade de seus humildes amigos, e esta é a maior forca do trabalhador pobre, a união (um dos textos cita isso).

Porem esta união não deve ficar neste contexto apenas, devem se unir para a busca de dignidades, para a luta, para a igualdade como dizia Marx e não fugir para o alcoolismo ou aceitar as condições de vida como se fosse uma punição para se “entrar no céu”. Como diz Aristóteles ”Aqueles que não tem nada procuram se igualar, e aqueles já têm procuram ser superiores”. Talvez demore um pouco até os trabalhadores serem alguns dias superiores por um tempo considerável e não apenas enquanto durarem as suas barricadas.

A ambição do homem não respeita fronteiras, religiões, culturas em fim, a hipocrisia acompanha a ambição onde quer que haja riqueza, porem esta riqueza não dura nem sequer um instante a partir do momento que ela é dividida pelo homem capitalista, que não vê ou não consegue ver limites para as suas ações que destroem tantas vidas como algumas que já foram comentadas acima, tanto as ações quanto às vidas que sofrem.

Que espera ti trabalhador para se unir a seus companheiros e reclamar do que tu precisa, pois o que tu precisa tu tem de direito. Dia-a-dia sofrendo e suportando a dor, procure seu remédio trabalhador.

Ônibus que voltam ao entardecer cheio de mentes que não sabem o que pode acontecer no outro amanhecer, inseguros no trabalho e com medo de o emprego perder, “se conformam” em sua vida ter.

Eustáquio de Carvalho Sant’Ana

Guerreiros da salvação

De um lado fome, miséria, opressão...

Em outro lado Guerra, Abusos, violência, morte...

Do outro lado Tirania, interesses, exploração...

Por outro lado lamento, revolta, indignação...


Lados que caminham sempre Unidos

Caminhando em uma única direção

Para o enriquecimento de alguns

Pela a causa das Nações


Poucos tentam porem não sabem como

Buscam solução para este abandono

São loucos & pirados

São Anjos dos desorientados


Continuem tentando

Pois vocês são o equilíbrio

Entre a hipocrisia e melindre

Entre o real e o imaginário


Continuem tentando

Pois o máximo que agora posso fazer

É isto escrever

Para apóia-lo no seu fardo.


Eustáquio de C. Sant´Ana

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A construção da ordem

Autor: Eustáquio Santana
UFJF 06/02/2007

Análise do livro A construção da ordem de José Murilo de Carvalho.

Carvalho, José Murilo. A CONSTRUÇÃO DA ORDEM: A elite política imperial. 4.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

José Murilo de Carvalho, historiador e cientista político, nos mostra em seu livro A construção da ordem, um panorama das elites políticas no Brasil Imperial, usando também comparações com outros paises para mostrar as particularidades de nossa elite. Analisando, desta forma, a maneira em que a elite acende ao controle do poder desde a formação do Estado e sua permanência nele. Em outras palavras, como se constituiu a Elite brasileira, a partir do fim da colônia.

Ao analisar o surgimento das elites, percebe-se que estas se comportam em um ciclo de coerção-persuasão, ou uma optando pela coerção enquanto outra pela persuasão. As elites na Europa cresceram a partir de uma tensão entre a expansão do poder dos funcionários reais e grupos sociais requerendo representação política. O Estado moderno então cresceu junto com a elite a partir implosão da política. A maior burocratização da mesma, a jurisdição compulsória, a monopolização do uso legitimo da força são um dos fatores que permitiu o surgimento do Estado Moderno.

Fatores estes já observados por Max Weber na qual o autor refere em sua obra. O poder nas mãos dos monarcas, diminuindo assim o da igreja e o da nobreza foi substancial para haver a acessão dos barões feudais. A criação da burocracia central, tanto a civil como a militar, a criação de parlamento, onde se tornou possível a representatividade dos estamentos, e depois a das classes, foram as principais características que surgiam na formação dos Estados, principalmente os parlamentares representativos como os Estados Unidos e a Inglaterra. Em Portugal, por sua vez, houve uma maior burocracia central que permitiu a permanência do absolutismo.

Nestes paises as transformações capitalistas no campo, permitiram grande enriquecimento e participação políticas destes donos de terras. Na Inglaterra eles dominavam o parlamento e os postos ministeriais.

Com a queda da renda na terra, estes aristocratas passaram a investir em outros setores como, por exemplo, o industrial, formando uma aristocracia capitalista. Esta que passou a cuidar do governo, dando mais atenção do que anteriormente, possibilitando facilidades aos grupos industriais do país.

Nesta elite que estava surgindo um aspecto permitiu um maior desenvolvimento, livrando muitos empresários de gastarem tempo cuidando da política, foram as profissões liberais, em especial os advogados.

Esses advogados permitiram maior dinamismo no que se refere às atividades burocráticas. Portugal, com a universidade de Coimbra, possibilitou a formação de juristas e magistrados que exerceram grande papel na política português e posteriormente na brasileira.

O autor distingue que nos primeiros paises onde houve uma revolução burguesa, existiram na elite política elementos da representação parlamentar. Diferente daqueles onde houve uma revolução burguesa retardada, como Portugal, em que se observa nessas elites o elemento burocrático.

A partir dos fatos históricos como as revoluções que ocorreram no século XX, é de se observar que as elites que predominaram de uma revolução burguesa retardada surgem da burocracia civil e militar.

Para o autor “a homogeneidade ideológica e o treinamento foram características marcantes da elite portuguesa criatura e criadora do Estado absolutista.” (p.37). A exemplo disso temos a formação da elite brasileira, uma cópia da de Portugal, treinada pela mesma. Porem Portugal passou a reduzir os poderes dos barões, o que não foi possível no Brasil, levando em conta o valor da terra no Brasil e a sua extensão comparada com Portugal, o que levou a um patriarcalismo. No Brasil uma “modernização conservadora” se mostrou difícil, pois a elite para implantar sua economia industrial precisava como nos mostra o autor, se aliar com elementos mais retrógrados da sociedade para assim implantar as suas reformas.

Partimos então para as definições da política nacional. Lembrando-nos a respeito da pergunta que caracteriza a elite: quem manda? No Brasil existiram algumas possibilidades, logo descartadas. A indústria é uma delas, A sociedade auxiliadora da indústria nacional, que produzia basicamente alimentos agrícolas e não os industriais em si. Viu-se mais tarde que esta indústria não possuía poder suficiente para influenciar nas decisões do país. Outro grupo que não poderia se enquadrar como elite foi a sociedade, homens que cuidavam destas indústrias, também não tinham poder para pressionar o governo em prol de seus interesses, a pesar de haver dentre eles muitos políticos.

A Associação Comercial, criada em 1920, teve mais forças para atuar na política brasileira, sendo ela invadida no ano seguinte pelas tropas nacionais a fim de dispersar seus membros que votavam pela permanência do rei. Ela reabriu em 1834. Estes nada comparados com o poder que tinha o Banco do Brasil e por meio deste os comerciantes poderiam influenciar as políticas monetárias. A associação por sua vez encontrava divergências internas, nelas encontramos cafeicultores e empreendedores como Mauá. O ultimo que gozou por muito tempo de privilégios, uma vez que muitos imperadores recorriam a os comerciantes e financistas para requisitar empréstimos, uma relação intima com o governo que poderia sim influenciar decisões mais consideráveis.

A imprensa era uma ferramenta política importantíssima neste momento, no período do Império foi o momento em que ela mais teve liberdade. Em suma seu poder era grande e era utilizada por muitos políticos que não colocavam sua opinião diretamente nas assembléias. Muitos jornais e matérias eram assim escritos por eles.

A política imperial foi mantida principalmente pela supremacia do poder civil, no qual o exército e a marinha se mantiveram passivos. Mas não demorou muito, após a guerra do Paraguai, o exercito começou a formar uma oposição interna, mas que segundo o autor “permaneceu marginal até o fim”. (p.55).

Não devemos esquecer nestes grupos que compuseram a política brasileira, com menor ou maior influência, os padres. Estes atuando em sua maior parte na burocracia estatal, a educação e o casamento era sua maior participação. A elite brasileira desta maneira era: antimilitar e anticlerical.

O autor analisa então os verdadeiros argentes que tomam as decisões dentro do governo central, em ordem de importância dada por ele temos: os ministros, seguido dos senadores, deputados e os conselheiros que tomavam as principais decisões políticas no país.

O que poderia assim garantir uma maior hegemonia de nossa elite política? Educação, essa que assim como hoje reproduz o favorecimento das elites nacionais. O autor nos mostra três razoes pelo qual a educação se torna um instrumento poderoso na elite imperial. O fato de que na grande maioria somente a elite possuir uma educação superior, existindo poucos casos fora dela; O ensino ser em sua maioria jurídico, possibilitando maior hegemonia entre essa elite; O fato dessa educação proporcionar uma ideologia homogênea, primeiramente dada em Portugal, posteriormente em quatro universidades brasileiras.

Em Coimbra, por volta de 1599, eram os jesuítas os que mais influenciavam a educação, defendendo assim o ensino religioso. Mas estes foram expulsos em 1759 por Sebastião de Carvalho e Melo. Posteriormente surgiu o iluminismo, trazendo a Coimbra as ciências naturais, aumentando assim o numero de matemáticos, médicos, biólogos sendo muitos entre eles brasileiros, filhos da elite. Muitos desses formandos trabalhavam a serviço de Portugal no Brasil, estabelecendo assim uma ligação forte entre essas duas sociedades, formando vinculo devido a necessidade de ir estudar em Portugal.

Um contraste é que as colônias espanholas permitiram desde cedo a implementação das universidades em seu território. Esse contraste é também observado por Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil. Esse fato se caracteriza pelo medo de Portugal de perder sua influencia política no Brasil.

Escolas de ensino superior foram posteriormente criadas no Brasil, mas somente depois da independência tiveram um cunho político. Antes, se caracterizavam pela medicina, engenharia e outros.

O preconceito era de se esperar naquela sociedade no que se diz respeito aos negros, o autor nos menciona um fato de que os professores se recusavam a cumprimentar os negros alegando que eles não poderiam ser doutores.

Muitos dos engenheiros formados no Brasil possibilitaram uma melhor infra-estrutura no país, com a criação de estradas e pontes. Uma elite formada aqui e como disse, não “produzida” para a política. Já a elite brasileira como os bacharéis era altamente preparada para governar, entre ela podemos destacar os principais argentes políticos: ministros, senadores, deputados e mesmo os conselheiros.

A educação brasileira por sua vez, iniciava a criação de uma ideologia nacionalista, se iniciou o que Portugal temia: o isolamento de seus interesses no Brasil. Como descreve o autor:

“A turma de 1866 da escola de São Paulo incluía Castro Alves, o poeta abolicionista e de tendências republicanas; Joaquim Nabuco, futuro deputado, líder Abolicionista e monarquista convicto; Afonso Pena, futuro ministro no império e futuro presidente da republica; Rui Barbosa, futuro deputado no império, líder liberal e ministro republicano; Rodrigues Alves, futuro deputado no império e depois presidente da republica e Bias Fortes, um dos principais políticos de minas gerais na republica”. (p.83).

Muitos dos formados no Brasil participaram de movimentos ou ações como a inconfidência mineira e outras. A elite brasileira começava a enfrentar outro problema, a questão de que muitos formados não achavam emprego, uma vez que a maioria era empregada em cargos públicos, começando a abalar sua coesão e homogeneidade.

Observamos então que alem de educação era necessária uma ocupação. Ocupação esta que retornaria para a elite bens materiais e melhores direcionamentos para seus negócios, uma vez que esta ocupação se dará no plano do governo “representando” a sociedade. O autor observa que a economia agrário-exportadora-escravista, não permite uma maior divisão do trabalho, logo maiores diversidades de emprego.

O setor urbano se via dominado pelas atividades terciárias, principalmente devido às profissões liberais que estavam cada vez mais manifestadas no país. As pessoas que possuíam ensino superior no Brasil representavam 0,3% da população ativa, e 0,1% da população total, isso explica em parte a grande dominação exercida pela elite diante de uma população predominantemente analfabeta. Segundo José Murilo, “o Estado era o maior empregador dos letrados que ele mesmo formava”, logo houve uma união entre a elite política e a burocracia.

O autor separa os principais grupos profissionais do país: o grupo do governo, incluindo neste os políticos e magistrados; o grupo das profissões, caracterizando pelas profissões liberais, como médicos, jornalistas e engenheiros, e o grupo dos economistas, representados pelos proprietários de terras, banqueiros e comerciantes. Os bacharéis, entre eles os advogados foram os que mais continuaram a crescer na esfera política, ao contrario dos militares que caíram sua participação, principalmente após a guerra do Paraguai.

É chamada a atenção para o “mito” que os fazendeiros, grandes proprietários de terras represente a elite brasileira em si, sendo que estes representaram 50% dos ministros, logo não sendo a elite em si do Brasil..

Nossa elite que se formou caracterizadamente burocrática, foi se tornando aos poucos liberal, devido como vimos a educação superior. Uma elite que se torna coesa e homogênea em seu todo.

No Brasil os cargos administrativos funcionavam através de uma circulação geográfica (rodízio). Sendo já esse rodízio essencial nas carreiras de militares e magistrados, e esta ultima ligada diretamente à elite, então se pressupõe a conotação política desse rodízio. A pessoa não permanecendo muito tempo no mesmo local evitava assim vínculos fortes onde permanecia.

É feita uma analogia como essa entrada na política fosse à entrada em um clube, e como ocorre com freqüência no Brasil é necessário sempre ter amigos influentes ou uma família que tenha essa influência. Torna-se muito difícil, para um jovem político iniciar sua carreira sem esse contato. Hoje continua esse quadro, somente o estudo não é suficiente para uma pessoa que vem de família pobre e busca uma grande acessão social, existindo claro algumas exceções.

O autor nos mostra que dentro deste clube, a circulação geográfica de senador, deputados, conselheiros e presidentes de províncias têm um grande efeito unificador no país, uma vez que contatos são estabelecidos e possíveis acordos feitos.

O referido clube, a elite política, tem entre seus membros o deputado geral, o conselheiro de Estado, a senatoria, o ministério e a presidência da província. Os outros como os deputados e os magistrados buscam a sua ascensão no mesmo. Basicamente para se chegar ao topo o bacharel em direito é um dos grandes requisitos.

Um ponto também importante a ser mencionado refere-se ao tempo que um político permanece no cargo, sendo de períodos relativamente rápidos. Ao analisar esse tempo o autor nos cita Pareto, que avalia que um tempo curto uma elite se renova muito mais rápida é possibilita oportunidades a novos talentos, mas podendo perder em experiência política e capacidade administrativa. Neste caso, isso deve ser vista de maneira positiva devido à concorrência que existe para a posse destes cargos administrativos.

Quanto à coesão da elite, podemos observar que ela não é cem por cento, uma vez que existe um certo desequilíbrio para as grandes províncias causadas basicamente pela sua rentabilidade econômica e por sua população. Em algumas partes houve divergências quanto a que modelo liberal o país deveria seguir, se era o modelo inglês ou americano (entre os liberais), ou o francês (pelos conservadores). Nossa elite por tanto se dividia em algumas questões, não havendo uma homogeneidade tão forte.

Assumindo assim estes cargos, vemos que não poderia resultar de outro modo que se não de uma elite ligada fortemente com a burocracia. A burocracia foi útil no sentido de que ela evitava conflitos, permitindo a organização e a ordem. Ela dividia funções, salários, pessoas profissionais das não profissionais, e as tarefas políticas de cada cargo. Como não é de se esperar, devido a sua influencias, os setores mais importantes dentro desta burocracia eram o judiciário e o militar, sendo eles um dos primeiros funcionários do Estado.

Esta divisão interna do trabalho contribuía para que a burocracia imperial reduzisse seu poder de controle e de direção da sociedade, sendo também um contribuidor a divisão dos funcionários pelo poder central, provincial e local.

No Brasil gastava-se muito com a burocracia, segundo o documento de visconde do Uruguai em 1842 gastava-se 96% com gastos administrativos, passado para 58% em 1889. Ao passo que os gastos sociais e econômicos passaram de 4% para 41%. Isso devido ao Brasil em seu período imperial, e muito fraco no tempo de hoje, não conseguir atingir com forças iguais todo o país, ou seja, uma dificuldade de englobar igualmente a periferia.

Neste ponto de não conseguir abranger toda a província, os governos recorriam a grupos ou indivíduos que prestassem o serviço de vigilância para o estado nessas regiões afastadas. Neste ponto semelhante ao poder que eram concedidos aos coronéis.

“Vários aspectos mencionados anteriormente já sugerem que, se a burocracia imperial não constituía estamento, também não se pode dizer que se adequasse ao modelo de burocracia moderna como definida por Weber. A definição, no que se refere aos funcionários, inclui nomeação por contrato com base em qualificações técnicas; lealdade aferida pela fiel execução dos deveres, com base em regras impessoais; e perspectiva de carreira. A ação desses funcionários, ainda segundo Weber, se assemelharia à de uma maquina em precisão, regularidade, eficácia, impessoalidade e predizibilidade. A administração imperial estava longe desse modelo ou tipo ideal.” (p.159).

O autor nos mostra que os salários eram variados, as nomeações e promoções eram realizadas muitas vezes por apadrinhamento, o que não resultava em funcionários mais competentes. Por outro lado a burocracia ajudava a manter muita gente empregada, principalmente, como vimos, nos centros urbanos. Entre esse podemos destacar os setores médios urbanos e os proletariados, ajudando a manter assim um status quo daquela sociedade.

Neste contexto, os juízes, padres e soldados, sofreram grandes mudanças no que se referem as suas presenças em nossa política, como veremos agora.

O magistrado com tem se demonstrado foi um dos principais argentes políticos, predominando na burocracia desde Portugal. No Brasil muitas normas existiam para aqueles que visavam uma promoção, alem da rotatividade nas províncias, não era permitido abrir um estabelecimento no local e nem casar. Tudo para que ele não se desviasse de sua missão e nem do compromisso para com o rei. Mas a presença excessiva de magistrados na representação nacional começava a incomodar outros grupos. A sociedade por sua vez não se via representada, e quando alegavam que a situação se igualava no campo, muitos magistrados se diziam também fazendeiros.

Os magistrados se defendiam, dizendo que eram treinados, que tinham educação suficiente, dando-lhes competência, e o conhecimento para se fazer a aplicação da lei. Porem a reforma judiciária em 1871 não evitou que grande parte desses magistrados passasem a não exercer mais a representação nacional, reduzindo o peso do Executivo e aumentando a representatividade do Legislativo.

Os padres tinham grandes influencias das ideologias provindas das revoluções Francesa e americana. Eles também exerciam cargos públicos e recebiam do Estado. Quanto a eles, deve-se notar suas participações na inconfidência mineira e Conjuração Baiana, mas seus princípios eram antes políticos do que sociais, uma vez que não chegaram a apoiar a abolição da escravatura e nem a reforma nas terras.

Ao analisar os militares, devemos observar uma diferença entre o exército e a marinha. O primeiro era constituído basicamente de pessoas de origem pobre. Já a marinha era o objetivo de muitos filhos da aristocracia cabocla, diferenciando assim os dois quanto à origem social. O ideal do exercito se constituía do positivismo, com destaque na educação, industrialização, infra-estrutura e a abolição da escravatura. Neste sentido o exercito cresceu e se aperfeiçoou, educando seus jovens e formando um grupo político coeso e de representatividade. Desta forma estes dão os três grandes grupos que predominaram, na burocracia brasileira neste período, final do Império.

Por fim o autor nos mostra as ideologias vigentes nos partidos políticos imperiais. Existem várias hipóteses quanto às ideologias dos dois principais partidos políticos na época imperial. A grosso modo, ficam os liberais de um lado, representantes da burguesia urbana, dos comerciantes, dos intelectuais e dos magistrados e os conservadores de outro representando os interesses agrários, principalmente os cafeeiros. As principais questões em jogo foram a abolição do tráfico, as leis de terras, a reforma das leis de descentralização e a restauração do conselho de Estado.

O programa liberal visava uma reestruturação interna do país, educação, indústria, comércio, abolição da escravatura, ele variava entre as teses radicais e progressistas. Em um manifesto criado em 1869, vê-se uma idéia de Estado Mínimo, no qual o mesmo não deveria intervir alem da justiça, da polícia, da ordem e dos impostos. Esse manifesto caracteriza o pensamento liberal.

Já em São Paulo encontramos o Partido Republicano criado em 1873, na qual sua organização dispensou manifestos, representando 29 municípios paulistas, este partido se encontra coeso, diferente do que acontecia com o Rio de Janeiro. Sua principal reclamação era a federação, na qual impedia o fortalecimento da província, alem das arrecadações que eram cobradas da mesma, fazendo assim com que buscassem autonomia provincial.

Ambos os partidos, como se era de esperar, possua proprietários de terras, porem o conservador se compunha também de burocratas, defendendo descentralização, enquanto que os liberais de profissionais liberais, defendendo a centralização do poder. As províncias do Sul buscavam maior autonomia, portanto a descentralização do poder, devido a suas condições financeiras, enquanto que a do Rio e do Nordeste defendia a centralização do poder, interessada na estabilidade do sistema.

Podemos ver que neste aspecto que quando se colocou o projeto do ventre livre em votação os que mais apoiavam eram as províncias do Nordeste, e os que mais as negava eram as do Sul, incluindo São Paulo, esse mesmo quadro se encontra até a abolição da escravidão.

Entre os liberais houve uma divisão interna devido a votação da Lei dos Sexagenários, no qual dificultou que seu programa progressista tomasse continuidade, fortalecendo, desta maneira os conservadores. Mesmo com esta divisão interna os liberais conseguiram aprovar vários projetos como a Lei do Ventre Livre, a Abolição, e a Lei das Terras.

Mas neste tempo de disputas entre estes grupos, vinham os militares que não se identificavam com nenhum deles, gerando instabilidade política durante a Repúurante a Rebvam com nenhum deles, gerando instabilidade politica s que nao , fortalecendo os concervadores. de Janeiro.ados,assblica.

Por fim vemos que o Brasil, diferente das outras colônias, teve uma elite política hegemônica, basicamente devido a sua formação em Portugal. Quando o não existe essa classe dominante o Estado se responsabiliza pela manutenção da sociedade. No Brasil o Estado e as elites, principalmente as do Sul, que geravam grandes lucros ao Estado, mantinham estritas relações. Mas a “dialética da ambigüidade” mencionada pelo autor, nos mostra que a dinâmica pode ser alterada, como aconteceu no caso da Lei do Ventre Livre, em que as províncias do Nordeste fizeram oposição as do Sul, vencendo-as. Neste aspecto nada pode fazer o Estado em relação às províncias do Sul.

“O fato ilustra a idéia da dialética da ambigüidade, já expressa por Joaquim Nabuco quando disse que se o governo era uma sombra da escravidão, era também a única força capaz de acabar com ela: ‘Essa força é capaz de destruir a escravidão, da qual aliás dinama, ainda que, talvez, venham a morrer juntas’.” (p.234).

Em nosso país a oposição ocupa um papel importante em alguns casos, como o regular e “vigiar” a ação do partido ou governo opositor. Muitas vezes nossa burocracia continua com suas falhas, e em outras, trabalha favorecendo grupos.

Por fim, após a república, continuamos tendo uma elite política que pouco representa realmente sua população. E uma população que continua em grande parte com uma fraquíssima educação, sem a possibilidade de uma equivalente aos filhos da elite. Assim a hegemonia de nossa elite se mantém em nossos dias.

No que se refere a imprensa, hoje obviamente muito mais forte que naquela época devido aos meios de comunicação em massa, é tirado grande proveito por parte da elite, que muitas vezes a controla e faz dela uma ferramenta de dominação, tanto no âmbito econômico, quanto no político.

O autor nos permite, dessa maneira, uma compreensão da formação de nossa elite, e a partir desta compreensão faz também compreender como ela se manifesta nos dias de hoje e em nossos meios.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Casa Grande e Senzala

UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

POLÍTICA IV

DATA: 01/02/2007

Autor: Eustáquio de Carvalho Sant´Ana

Análise do livro Casa-grande & senzala de Gilberto Freyre.

Freyre, Gilberto. CASA-GRANDE & SENZALA: Formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 50.ed. São Paulo: Global, 2005.

O livro Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freire, é um grande marco para a literatura e a academia brasileira. Relata quase que como em um romance, mas sem deixar passar por uma analise rigorosa, os fatos de uma época formadora da identidade brasileira. A embarcar em sua “aventura do exílio”, a Bahia e depois a Portugal, o autor recolhe dados e informações sobre a nossa formação cultural, iniciando assim uma das obras indispensáveis a qualquer um que deseja estudar nossa formação cultural, política e social e compreender o que significa ser brasileiro. Alem de grande auxilio para uma compreensão de nossa sociedade, ele é permanece, como todo o grande clássico, contemporâneo.

A partir do primeiro capitulo, Características gerais da colonização portuguesa no Brasil: formação da sociedade agrária, escravocrata e hibrida, é possível perceber as relações dicotômicas tratadas, na qual o autor se refere como um “processo de equilíbrio de antagonismo” (p.116), como por exemplo,

“o antagonismo de economia e de cultura. A cultura européia e a indígena. A européia e a africana. A africana e a indígena. A economia agrária e a pastoril. A agrária e a mineira. O católico e o herege. O jesuíta e o fazendeiro. O bandeirante e o senhor de engenho. O paulista e o emboaba. O pernambucano e o mascate. O grande proprietário e o paria. O bacharel e o analfabeto. Mas predominando entre todos os antagonismos o mais geral e o mais profundo: o senhor e o escravo”. (p.116).

Deste ultimo antagonismo, senhor e escravo, podemos perceber o titulo do livro, e a partir destes antagonismos o autor busca a compreensão de como eles se equilibram e se desenvolvem naquela sociedade. Passando assim a relatar suas relações, comportamentos, influencias que se desenrolarão nos outros capítulos.

Ao relatar a sensualidade da índia, os fatos de como os portugueses as desejavam devido a sua nudez e o despertar de fantasias, o autor caminha para outros pontos como, por exemplo, a preferência da mulher branca para o casamento e a mulata para se satisfazer sexualmente. Em suas próprias palavras: “Com relação ao Brasil, que diga o ditado: Branca para casar, mulata para f..., negra para trabalhar” (p.72). Nem mesmo o padrão de beleza da mulher daquela época, influenciou nas constantes relações dos portugueses com as índias. Alem de estas mulheres pertencerem somente à alta classe não havia muitas no Brasil, possibilitando ainda mais o grande fator que auxiliou como uma ferramenta os portugueses em sua conquista: a mestiçagem. Primeiro com índias, depois incluiu as negras, formando o caboclo e a expansão da população. Os próprios padres, dizia o autor, “precisavam descer com cuidado, se não atolavam o pé em carne” (p.161).

A mestiçagem é um dos temas chaves no livro, assim como o poder patriarcal e a escravidão. A formação de uma população cabocla resistente aos intempéries do tropico possibilitou a formação de uma nova sociedade, um elemento chave na conquista do trópico. Os portugueses se reproduziam rapidamente nesta terra, antes da chegada das negras, as índias foram os objetos de seu desejo.

Como relata o autor, a carência do português por meses navegando em auto mar se depara com a nudez da índia, seus banhos nos rios e a caracterização da ninfa desperta ainda mais o desejo do português. São facilmente “subornadas” por pequenos objetos como espelhos pentes e outros devido a sua vaidade, se entregando de “pernas abertas” nas palavras do autor. Além destes fatos outro fator que ajudou na reprodução foi o fato das tribos serem poligâmicas. As mulheres índias formaram assim base da família brasileira pela falta da mulher branca.

Com a vinda dos negros para o trabalho nos grandes latifúndios as negras passam a ser outro desejo sexual dos homens. Habitando a senzala e a Casa-Grande ela está mais perto do senhor de engenho, fazendo com que este muitas vezes tenha relações com ela. Isso provoca um grande ciúme em sua esposa, que muitas vezes manda arrancar os dentes das negras bonitas.

As negras tiveram grande participação na vida na casa-grande, muitas vezes amamentavam os futuros senhores de engenho, estes que passavam a maior parte de sua infância brincando entre os outros garotos filhos de escravos e que aprendia desde cedo a praticar maldades com os negros.

A partir do momento em que o garoto, filho do senhor se vestir como tal, e receber a educação que lhe espera, ele passará naturalmente a se diferenciar das outras crianças. Quanto a sua vida sexual, esses meninos iniciam-na também com as negras das senzalas, segundo o autor com aproximadamente 13 anos.

A violência com a negra foi muito analisada pelo autor. Objeto dos desejos sexuais dos homens, do menino adolescente ao senhor de engenho, a negra sofria por parte da mulher branca os castigos mais variados, como disse, muitas vezes pelo ciúme. Ela cumpria as tarefas que normalmente estariam destinadas à mãe de família, a senhora.

Ao analisar a vida sexual neste período, o autor observa a grande moléstia que atingia grande parte da população sexualmente ativa, a sífilis. Uma doença que desembarca nas terras brasileiras, trazida pelos europeus. Primeiramente contaminando as índias, depois as negras, e desta maneira toda uma população. O relaxamento quanto a esta doença custou muitas vidas, segundo o autor, a doença causava dez morte em para cada mil habitantes. Como é característico da leitura, o autor nos menciona a crença existente entre os homens de que para curar a sífilis era necessário se relacionar com uma negra virgem.

Muitos aspectos dos índios e negros influenciaram fortemente na nossa formação cultural. O banho, por exemplo, é um deles. As índias eram vistas frequentemente nos rios se banhando até dez vezes durante o dia, enquanto os europeus eram sujos e repulsivos. A culinária foi outra forte influência. Pelos negros temos entre outros a feijoada, muitas vezes eram alimentos que vinham da sobra da casa-grande. E dos índios conhecemos o milho, o caju, mingau e a farinha de mandioca, grande base da alimentação colonial.

Quanto à questão alimentícia na colônia, Gilberto Freyre relata a falta de alimentos nas cidades, muitas vezes tendo que ir buscar nas casas dos mais ricos. Muitas especiarias eram importadas de Portugal, como azeitonas, pimenta e outras. A alimentação era “má nos engenhos e péssima nas cidades” (p.102). Estes fatores se devem, sobretudo, a uma atenção maior a monocultora, como a cana-de-açúcar, impossibilitando tempo aos cuidados na plantação de cereais e legumes.

Estes mesmos aspectos referentes à alimentação se assemelham a observação de Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil. Os dois autores se referem à dominação do campo sobre a cidade principalmente pelas questões econômicas e alimentícias, tendo toda a sociedade assim voltada para as monoculturas. Outra questão colocada pelos dois é quanto à dificuldade de iniciar o plantio nas terras coloniais, de dominar as férteis terras, pelo fato do clima tropical e das intempéries referente ao solo e rios que não se encontrava na Europa.

Ainda quanto à alimentação, o Freyre refere-se ao negro como “protegido” na casa-grande, pois este recebia alimentos sobre a responsabilidade do senhor de engenho, mesmo sendo muitas vezes precário, eles eram transformados em ricos nutrientes na sua dieta. Com a abolição da escravatura, por sua vez, os negros passaram a buscar seu próprio sustento pelo trabalho, muitas vezes recebendo muito pouco e caindo a qualidade de sua alimentação. O que de maneira alguma poderia justificar por sua vez a escravidão. As torturas que sofriam a submissão ao trabalho árduo e pesado, a possessão sexual das negras, e a falta de liberdade em si traziam grandes dificuldades as suas vidas.

As cantorias dos negros quebravam o silencio da casa-grande, e a liberdade religiosa concedida pelo senhor de engenho permitiu no Brasil a propagação das religiões afro-descendentes como o candomblé. A autoridade do senhor quanto à religião se caracteriza nas pequenas igrejas construídas perto da casa-grande e em seu mando, sendo assim, o senhor de engenho, o poder local. Usando da força e da violência para legitimar seu poder. Com respeito às igrejas, foram estas através dos jesuítas, que partiam para a catequização dos índios.

A família patriarcal, latifundiária, será assim, pela visão do autor, base e a origem da formação social brasileira.

No capitulo dois, O indígena na formação da família brasileira, o autor retoma o tema dos índios, descrevendo sua importância para a conquista portuguesa nos trópicos. Os portugueses não conseguiram escravizar os índios, tanto pelo fator de serem nômades quanto pelo fato do trabalho em sua tribo ser realizado pelas mulheres, sendo eles na maioria caçadores. Podemos avaliar também que, diferente dos negros, que eram deslocados de outras terras, os índios conheciam bem as terras e suas “armadilhas” podendo sobreviver em uma fuga, sendo de difícil domínio português.

Por outro lado, quando aliados, os índios foram muito úteis na defesa do território colonial e das regiões açucareiras, e junto com eles os mestiços. De fato este contato provoca um desequilíbrio no modo de viver do índio e sua relação com a natureza.

Em Raízes do Brasil (HOLANDA, 1995) há também uma interessante questão sobre o índio e o negro. O primeiro caracterizado pela sua ociosidade, pelo o gosto da caça e não da plantação, se assemelhando à nobreza, e é assim exaltado pelos romancistas posteriormente como possuidores das virtudes dos antigos cavaleiros e fidalgos, já os negros foram colocados apenas como submissos e rebeldes.

A mulher indígena teve um grande papel na vida colonial, possibilitaram como já foi dito a mestiçagem, constituindo a população colonial mestiça. As índias suprimiram devido à falta de mulher branca, os desejos dos portugueses.

O autor analisa as matanças que ocorriam dos índios, estas muitas vezes feitas pelos portugueses e mamelucos a mando dos plantadores de açúcar, mas não seria pior se não fossem considerados em determinados casos hereges e bugres.

Como o autor enfatiza, alem da culinária “vários são os complexos característicos da moderna cultura brasileira, de origem pura ou nitidamente ameríndia: o da rede, o da mandioca, o do banho de rio, o do caju, o do ‘bicho’, o da ‘coivara’, o da ‘igara’ (...) Isso sem falar no tabaco e na bola de borracha.” (p.232).

No capitulo três, O colonizador português: antecedentes e predisposições, é retomado a alguns pontos como a miscigenação, e a eficaz conquista dos portugueses as terras brasileiras. Quanto à escravidão dos negros, o autor defende que foi o colonizador “europeus que melhor confraternizou com as raças chamadas inferiores” (p.265). O autor com sua escrita particular descreve: “(...)só faltou transportar da África para a América, em navios imundos, que de longe se adivinhavam pela inhaca, a população inteira de negros(...)”(p.265). Negros esses que influenciaram diretamente, assim como os índios, em nossa formação cultural como já citado.

Outro ponto foi a luta dos cristãos contra os infiéis (bugres e hereges) que causou segundo o autor a união de forças antagônicas, como o jesuíta e o senhor de engenhos, paulistas e baianos. Permitindo assim uma aproximação na esfera política da colônia de pólos opostos, uma unificação política e social que não seria possível sem o combate à heresia. Forma-se assim uma hegemonia política.

É observada ainda a miscigenação do povo português. Com influencias vindas da África, depois com influencias mouras e árabes. Portugal se constituiu por uma mesclagem destes povos. No lado econômico não foi diferente, os vários casamentos permitiram uma regular distribuição de renda. Um povo que de suas origens sofre a miscigenação, passa a conquistar outras terras, em especial o Brasil, com a mesma ferramenta.

A coroa na conquista destas terras deixou tudo de inicio nas mãos de particulares para se isentar de gastos. Mas não foi só financeiramente que a coroa se afastou da colônia, todas as questões judiciais e de defesa do território ficaram por conta dos grandes senhores de engenho. Com todo esse poder os senhores se tornaram verdadeiros reis. Reis estes que formaram, como foi dito, a origem da sociedade brasileira. Somente depois a coroa foi perceber a rentabilidade que a colônia poderia oferecer, em especial com o engenho de açúcar.

Portugal se viu na necessidade de mão-de-obra para povoar as colônias. A igreja incentivou vários tipos de casamentos e como o autor relata a ajuda de santos não foram poucas. Um grande resquício que permanece forte em nossa cultura em nossa cultura: a fé nos santos. Um Brasil formado pela mistura cultural entre portugueses, índios e negros.

Já as trocas culturais com os índios foram muito valorativas para a permanência na terra. Questões como a já mencionada higiene, tanto pessoal quanto a referente à habitação foi de grande auxilio para evitar doenças. E quando estas existiam os curandeiros indígenas eram de grande ajuda, e até os jesuítas que impunha o catolicismo e declarava guerra contra esses métodos utilizavam de seus conhecimentos.

Nos últimos dois últimos capítulos, O escravo negro na vida sexual do brasileiro, o autor nos mostra com grande clareza a participação dos negros na nossa formação, suas influencias e vários fatos que nos fazem compreender a sua vida.

Um parágrafo formidável pode representar um pouco do capitulo. Desde moleque o filho do senhor convive com os negros, e essa convivência, assim como em nosso sangue (mestiçagem), demonstra nossas raízes:

“Na ternura, na mímica excessiva, no catolicismo em que se deliciavam nossos sentidos, na musica, no andar, na fala, no canto de ninar menino pequeno, em tudo que é expressão sincera de vida, trazemos quase todos a marca da influencia negra. Da escrava ou sinhama que nos embalou. Que nos deu de mamar. Que nos deu de comer, ela própria amolengando na mão o bolão de comida. Da negra velha que nos contou as primeiras historias de bicho e de mal-assombrado. Da mulata que nos tirou o primeiro bicho-de-pé de uma coceira tão boa. Da que nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama-de-vento, a primeira sensação completa de homem. Do moleque que foi o nosso primeiro companheiro de brinquedo.”

Um ponto colocado se refere a observar a tese do caráter eugênico, no qual o senhor escolhia as melhores escravas para se relacionar, as mais sadias e as mais bonitas. Não diferente ocorreu com os padres, formando eventualmente uma elite mulata, saudável.

O autor também trata de outras questões gerais como a seriedade dos meninos nas colônias, sempre sérios e com pouca infância, a rigorosa educação dos padres jesuítas para com as crianças influenciando diretamente na formação cultural do país, os trajes europeus que não se adaptaram ao clima nacional.

Até aqui vimos o menino, filho do senhor, quanto a sua iniciação sexual com as negras, sua infância com meninos negros, mas não nos referimos ainda quanto à educação das meninas. Estas eram criadas em ambientes patriarcais sobre grande tirania dos pais, esta que depois era substituída pela tirania dos maridos. Eram poucas as liberdades que tinham, “a esta negou-se tudo que de leve parecesse independência. Até levantar a voz na presença dos mais velhos.” (p. 501) Resquícios que se propagou em uma sociedade machista como a de hoje.

A culinária, a formação na infância, a passagem para a vida adulta, os adultérios, a mão-de-obra, tudo isso fizeram do negro uma grande importância como já observada na formação de nossa cultura. Com os índios aprendemos sobre os intempéries da terra, a higiene, noções de cura, e também foi grande importância no auxilio para a defesa do território e na formação do povo brasileiro junto com os negros.

Com grande criatividade o autor nos possibilitou viajar pelo o Brasil colonial e perceber as dificuldades da conquista deste território e nele o poder que era vigente, o patriarcal. Uma visão panorâmica partida da casa-grade e da senzala.

Gilberto Freyre analisa assim este período colonial e as relações de poder pelo ponto de vista patriarcal, as diversas organizações familiares existentes. Outros autores como o já citado Sérgio Buarque de Holanda e Raymundo Faoro buscam compreender este período pelo ponto de vista do “Estado”, a relação entre a colônia e Portugal, ou seja, outras relações de poder.

Casa-grade e senzala nos permite compreender assim nossa formação cultural, nossas grandes influencias de negros, índios e portugueses. Resquícios que podemos compreender com essa leitura. Alem é claro da avaliação política daquela época, e a nossa formação devido a ela.

Hoje reconhecemos as grandes casas-grandes (elite) e as inúmeras senzalas (favelas) espalhadas pelo nosso país. Condições de trabalhos que são ou se aproximam de serem escravos.

A educação também como a vista Freyre, que transforma a vida do menino em senhor, também em nossa época ela existe, traz grandes oportunidades ao individuo. Mas alem da educação, a acessão social depende de outros fatores como ser ou conhecer pessoas da “casa-grande”. Assim essa obra nos permite pensar a sociedade atual, tanto no auxilio de sua compreensão como na reprodução da estrutura de um sistema existente.